Lillian Eichler: A Primeira Copywriter Mulher do Mundo

Lillian Eichler: A Primeira Copywriter Mulher do Mundo

Lillian Eichler Watson é muito provavelmente uma das muitas mulheres incríveis que você nunca ouviu falar: uma copywriter prodígio de 1920 que se tornou milionária e best-seller.

Sua data de nascimento é incerta, registros apontam que ela nasceu entre 1901 e 1902, filha de imigrantes Judeus Húngaros que gerenciavam uma tabacaria no bairro Harlem, em Nova York, conhecido por sua tradicional comunidade negra e judaica.

Lillian não tinha uma educação universitária, mas sempre teve aptidão com a escrita e estudava à noite. Com o grande senso de responsabilidade que ser da primeira geração de imigrantes e a mais velha de 4 irmãos traz, Eichler foi à procura de um emprego em agências de publicidade de Manhattan.

Lillian Eichler e seus irmãos

Em 1919, através de indicações, conseguiu contato com a Ruthrauff & Ryan, a principal agência de publicidade dos Estados Unidos na época. 

Não contratamos judeus… ou mulheres” foi o que ela ouviu de primeira. Ela não se deixou desanimar e pediu que pelo menos dessem a chance de ler o material que ela escrevia. Sua escrita foi o suficiente para abrirem uma exceção pra regra. 

Ela foi contratada na hora como copywriter.

A Ruthrauff & Ryan era uma agência inovadora: se diferenciava por abandonar as comuns ilustrações luxuosas dos anúncios da época e por ter adotado um estilo tablóide, com histórias, headlines e fotos que causavam impacto. 

A agência reunia copywriters icônicos como Maxwell Sackheim e Victor Schwab, e no meio dessa equipe vibrante de publicitários estava, surpreendentemente, uma mulher jovem. 

Se isso acontecesse hoje, já seria notável, imagine há um século atrás.

Seu trabalho na Ruthrauff & Ryan

Uma vez trabalhando na agência, Lillian teve seus primeiros trabalhos escritos para a campanha do sabão Rinso.

Ela continuou responsável pela publicidade da marca pela maior parte de sua carreira, criando até mesmo um jingle para rádio que se tornou uma das campanhas mais famosas da época.

Lillian também escreveu para uma das contas mais importantes da R&R: a Cocomalt, uma bebida láctea achocolatada. E é principalmente através dos anúncios da Cocomalt que podemos perceber o estilo de Lillian e da agência se unindo. 

Os impactos da Grande Depressão, antes e depois da quebra da bolsa de Nova York em 1929, forçaram as agências de publicidade a se adaptarem desesperadamente ao contexto social e econômico, foi aí que a Ruthrauff & Ryan se destacou ainda mais, adotando um estilo de venda ainda mais agressivo. 

Observe a diferença de anúncios para o mesmo produto, onde o primeiro de 1929 carrega um ar gracioso e amigável, usando a headline “Eles voltam para a escola tão animados… e depois?” enquanto o segundo de 1931, já é impactado fortemente pelas necessidades do contexto, usando a headline “As pessoas tinham dó do meu menino, ele era tão magro…“. 

E assim como mencionamos antes, as ilustrações luxuosas foram substituídas por headlines e fotos impactantes. 

Lillian tinha maestria em dominar o estilo necessário para uma época onde as pessoas não podiam se dar o luxo de comprar algo que parecia simplesmente “bonitinho” e agradável. 

Era crucial atiçar o sentimento de necessidade no leitor, e sua maior ferramenta para isso era a ansiedade social e o sentimento de vergonha

“As pessoas tinham dó do meu menino, ele era tão magro… mas agora é um dos rapazinhos mais fortes da vizinhança”

Os anúncios de Eichler para a Cocomalt retratavam situações que induzem vergonha às mães: outras mães comentando como seu filho parece desnutrido, como suas crianças vivem brigando porque se sentem esgotadas… e o que é dito sobre os filhos, reflete nas mães.

Qual é a solução para escapar dos julgamentos e fazer com que seus filhos estejam sempre contentes e fortes? Exato, Cocomalt.

A Ruthrauff & Ryan atribuiu o sucesso do seu maior produto, neste comunicado de 1933, a uma força de venda “alerta e agressiva.” 

 

“Quando as crianças estiverem briguentas… COCOMALT pode ajudar!”

“Cocomalt tem seu maior ano na história”

Os copys de Lillian para a Lifebuoy, marca de sabonetes, também demonstram claramente a mudança de estilo na abordagem do produto.

Mudando o holofote dos cuidados da pele que Lifebuoy poderia oferecer para o temido B.O, (abreviação para Body-Odor, que deu origem ao termo C.C, Cheiro de Corpo aqui no Brasil) você pode saber mais sobre a influência do termo B.O neste artigo aqui

Leitura recomendada: O porque usamos desodorante e o que copywriting tem a ver com isso

Novamente Eichler usou suas capacidades de storytelling para criar situações em que o leitor (principalmente mulheres) podiam se relacionar com os personagens e se perguntar “Eu já passei por isso? Ou pior… estou passando por isso?

“’Porque eu chorei depois da festa’… Uma das milhares de cartas que Lifebuoy recebe”

Grande parte dos anúncios da Lifebuoy da época adotaram o uso de tirinhas, a escolha parece contraditória com o estilo da Ruthrauff & Ryan, porém… os preconceitos dos principais líderes de publicidade, que acreditavam que as tirinhas só chamavam atenção de crianças ou classes mais baixas, foram refutados por uma pesquisa da importante Gallup Poll, que demonstrava que as tirinhas engajavam os mais diversos tipos de público.

Foi necessário somente a demonstração do aumento de vendas de alguns produtos com esse tipo de anúncio para que ele fosse abraçado pela Ruthrauff & Ryan, principalmente pelo contexto da época em que era crucial não perder para a concorrência.

Aqui, podemos perceber que depoimento e entretenimento se misturam, a tirinha é a representação visual de uma carta de uma jovem que teve a vida mudada e seus desejos atendidos após se livrar do terrível C.C através do uso da Lifebuoy. Novamente, a ansiedade social e vergonha, “Os homens se afastavam… Toda festa terminava em lágrimas para mim”, são provocados e logo em seguida a solução é oferecida: “Nunca, desde aquele dia, fiquei sem meu aliado mais leal – Lifebuoy. Ele acabou com meu C.C.

As tirinhas continham histórias mais simples e insossas, por questões práticas, mas tinham sua principal vantagem pelo entretenimento.

Seu maior feito – “Uma salada de frango, por favor.”

Pouco tempo depois da entrada de Lillian, em 1919, a editora Doubleday, apresentou um caso interessante para a Ruthrauff & Ryan: eles precisavam tirar das prateleiras cerca de 1000 cópias restantes de um livro de etiqueta pré-1900 de Eleanor Holt, “Everyman’s Encyclopedia of Etiquette”.

Esse case foi dirigido a Eichler, que criou o copy “Isso Já Aconteceu Com Você?” que evoca com maestria seu estilo que instiga a ansiedade social e sentimento de vergonha do leitor.

A conexão com o leitor é criada logo na headline, demonstrando uma jovem que derruba sua xícara de café na mesa e fica constrangida por não saber como agir, mas não para por aí: “Que erros você comete no salão de baile? […] Qual é a maneira educada de recusar uma dança?” e muitas outras perguntas fazem com que uma tensão e ansiedade sejam criadas no leitor que se percebe cada vez mais preocupado e se perguntando se ele realmente é hábil socialmente. 

Você pode descobrir ainda mais sobre como essa dinâmica é criada lendo o copy traduzido e com comentários aqui.

E perceba como esse estilo de Lillian brilha principalmente quando é aplicado num contexto que se trata sobre etiqueta. Que nada mais é que um conjunto de normas que ditam um comportamento social adequado, logo… não teve erro: o copy de Lillian foi um sucesso e todo o inventário foi vendido rapidamente.

E isso seria o simples desfecho de mais um caso de sucesso da Ruthrauff & Ryan… se a maioria das cópias não tivessem sido retornadas após os 5 dias oferecidos para conhecer o produto. 

O livro era muito arcaico, tanto em sua escrita e ilustrações quanto em seus conselhos. Trechos como “É considerado socialmente inaceitável uma mulher solteira comparecer ao teatro em companhia de um homem sem uma chaperone, sua acompanhante responsável.” já não faziam sentido para uma época de muitas mudanças culturais e sociais.

Mas para Doubleday, o trabalho não foi em vão. Se Lillian foi capaz de escrever um anúncio de sucesso que cativou o mercado para esse tipo de livro, ela também seria capaz de reescrever o livro. E foi exatamente essa a proposta que fizeram.

Lillian era uma mulher jovem e cada vez mais bem sucedida, não foi uma tarefa muito difícil reescrever esse livro refletindo os valores de sua época. E como uma boa copywriter, claro que sua escrita era mais engajante, amigável e simples de ler.

Mais Uma Vez Ela Pediu ‘Uma Salada De Frango, Por Favor” foi o copy de divulgação desta nova versão do livro. Aqui, a headline engaja pela curiosidade, muitas perguntas podem surgir na mente do leitor 

Lillian Eichler Watson - Again She Orders

Eichler pinta todo o cenário embaraçoso descrevendo detalhes simples da cena, demonstrando a ansiedade que a personagem sente por não saber como se comportar da melhor forma possível.

Sorrateiramente, o leitor recebe uma sequência de perguntas e passa a se questionar sobre o quanto ele e a personagem são inaptos aos costumes mais sofisticados. 

Não deixe de ler esse copy icônico completo, traduzido para português e com comentários aqui. Arrisco dizer que o Swiper é um dos poucos (se não o único) Swipe File a ter os copys da Lillian Eichler em boa resolução e traduzidos para português.

Ela escreveu um conjunto de pelo menos 5 anúncios, que foram veiculados por cerca de 2 anos em revistas de todo o país, e os livros eram vendidos por correspondência.

“Você é assombrado pelos fantasmas de SEUS deslizes sociais?”

Combinado com os custos de mala direta, a campanha custou US$1.500.000 (cerca de 22 milhões de dólares hoje). Tendo vendido 2 milhões de cópias e arrecadado cerca de US$4.000.000 (cerca de 60,6 milhões de dólares hoje).

Pelos números fica claro, o livro se tornou um best-seller e com Lillian Eichler escrevendo ainda mais livros, ela se tornou uma referência no mundo da etiqueta. 

Seu sucesso foi alvo de críticas, seus livros alcançavam as massas de imigrantes na América e mostravam um mundo onde mulheres eram cada vez mais independentes. 

Essa filha adolescente de imigrantes judeus se atreveu a escrever um livro sobre etiqueta!” foi uma das declarações de Emily Post, também escritora de livros de etiqueta e socialite com quem Lillian competia nas prateleiras. Mas até aqui você já deve saber… nada disso acabou por desanimar Lillian.

Seu legado

Sem dúvida a grande figura esquecida dos costumes americanos.” foi o que Laura Claridge, pesquisadora de grandes personalidades dos anos 1920, disse sobre Lillian.

Talvez seja difícil de acreditar que com tudo isso a carreira de copywriting de Eichler foi curta, se encerrando no ano de 1925. Se casando e com o dinheiro milionário das vendas de seu livro, dedicou seu tempo integralmente a cuidar de sua família e escrever seus livros na mansão que construiu em Queens, Nova York.

Lillian Eichler e seu marido

Lillian Eichler e seu marido

Novamente se diferenciando, Lillian não escreveu nenhum livro sobre copy ou publicidade, a maioria seguiam sendo sobre etiqueta e alguns até mesmo foram ficcionais.

A maioria dos copywriters clássicos que conhecemos passam décadas e décadas nesta carreira, escrevem livros sobre e também costumam ter trabalhado ou aberto agências que sobreviveram por décadas. Algumas no mercado até hoje. E essas agências mantinham registros de seu trabalho.

Não foi o caso da Ruthrauff & Ryan, com a ascensão do glamuroso “american way of life” no pós guerra a agência não foi capaz de se adaptar. O seu estilo de venda agressivo se enfraquecia cada vez mais e não contribuía para a imagem da R&R, que acabou sendo integrada com outra agência em 1957 e dissolvida em 1964.

Lillian Eichler Watson faleceu em 1979, tendo uma história que se destacou por seu pioneirismo, pela ousadia necessária para que suas aptidões e competências pudessem atravessar gerações.

Ela foi um exemplo prático de que copywriting está diretamente conectado a saber usar as palavras de maneira eficiente. Lillian aproveitou uma chance rara, desenvolveu seu próprio estilo observando os elementos que eram evidentes na sociedade de sua época e criou cartas marcantes, que são relevantes até os dias de hoje e serão por muitos anos a frente.

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Obrigada por ler até aqui!

Um abraço e até a próxima,
Bianca Celestino

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